“Os Segredos de Dumbledore” é o melhor da franquia, mesmo escorregando em erros passados

“Animais Fantásticos” chega ao terceiro filme com discussões mais profundas, mas esbarra novamente na inexperiência de JK Rowling no roteiro e em situações mal resolvidas. Por outro lado, discute política e tem ótimas atuações do trio Jude Law, Mads Mikkelsen e Eddie Redmayne

Terceiro episódio do universo estendido de Harry Potter, “Animais Fantásticos: Os Segredos de Dumbledore” é o melhor dos três filmes e, ao mesmo tempo, o que tem que lidar com mais problemas. Sim, o que parece contraditório, é a pura realidade quando falamos do universo bruxo pré-Potter e Voldemort. O que poderia gerar cenas criativas, diálogos com mais profundidade e soluções que apontassem para as próximas sequências, tem resoluções fáceis e, muitas vezes, decepcionantes.

Mesmo assim, “Os Segredos de Dumbledore” diverte muito, é recheado de efeitos visuais muito bem planejados e tem nos atores o seu ponto alto. Principalmente, o trio Jude Law, Eddie Redmayne e Mads Mikkelsen. São deles, as melhores atuações e maior consistência interpretativa. Isso, aliado a um mergulho maior no mundo bruxo, com o surgimento de novos lugares, animais e personagens, deixam o espectador longe de ter uma experiência negativa. O que fica mesmo é o sentimento de que poderia ser mais.

Nesta sequência, o foragido bruxo das trevas Gellert Grindelwald, interpretado por Mads Mikkelsen, movimenta as peças do xadrez político para assumir o controle do mundo mágico. Para tanto, vale trapaça, atentados e morte. Enquanto isso, um Alvo Dumbledore bem mais novo, vivido por Jude Law, e incapaz de detê-lo sozinho, momentaneamente, por causa de seu pacto de sangue, monta uma equipe bruxa para tentar frustrar os planos de Grindelwald. O grupo, liderado pelo magizoologista Newt Scamander de Eddie Redmayne, vão a campo sem conhecer bem os objetivos de sua missão.

A partir daí, desenrola-se uma série de ações que deixam fios abertos e sem muita explicação de porquê ocorrem dessa ou daquela forma. Serve como distração para que o telespectador não pare para pensar nisso, os alívios cômicos protagonizados pelo trouxa Jacob (Dan Fogler). Por sinal, o ator vai muito bem, obrigado, no que se propõe. Algumas cenas são exaustivamente explicadas, como se quem se estivesse na sala de projeção, não pudesse pensar a respeito ou não fosse tão fã ao ponto de não conseguir intuir o que acontece. São textos que mais parecem solucionar problemas de roteiro. Lembrando que Steve Kloves, já afeito ao mundo bruxo, divide a caneta com a própria JK Rowling, que já se mostrou como roteirista, bem menos talentosa do que como escritora.

Há enxertos na história que permanecem estranhos dias após você ter assistido e que precisam ser mais críveis para o próprio enredo. Exemplos, como a varinha (basicamente, sem utilidade) dada a Jacob. Uma espécie de efeito placebo que só o coloca em perigos desnecessários. Há ainda soluções fáceis para personagens que poderiam ser bem mais complexos. O que dizer do Credence de “Os Segredos de Dumbledore”? A expectativa em torno dele, que termina “Os Crimes de Grindewald” grande, mingua cena após cena. E a solução para ele e o seu parentesco com Dumbledore soa fácil demais, como se a narrativa quisesse se livrar logo do peso de não tê-lo desenvolvido.

Sem contar a participação de Maria Fernanda Cândido. Esqueça a questão óbvia de estarmos no Brasil e sonharmos com um protagonismo de Vicência Santos. O que se dá aqui é ver uma bruxa, que é o contraponto de Grindelwald no pleito mostrado na história, tornar-se apenas um apêndice. Como alguém tão importante pode ser apenas um apêndice?

Mas “Animais Fantásticos: Os Segredos de Dumbledore” tem grandes acertos também. Por isso, é o melhor da série. Porque os seus erros já são figurinhas repetidas das edições passadas. Quando fala de política, o filme vai bem. Insinua como os bastidores políticos podem ser sujos, interesseiros. Mostra como a sede de poder cega e como a insatisfação popular pode criar falsos salvadores, movidos por preconceito e intolerância. Aliás, a história poderia ter ido bem mais além nesta linha. Há material suficientemente rico em “Os Segredos de Dumbledore” para avançar no quesito, principalmente se considerarmos o recorte histórico de quando se passam os eventos, à beira de uma guerra no mundo trouxa. O paralelo entre a iminência de duas guerras de mundos igualmente paralelos daria uma charme a mais ao que é posto.

A reconstrução histórica dos locais, o modo de vestir-se, ou seja, design de produção e figurino dialogam muito bem. Preocupações mínimas ou específicas, como o nome completo do Ministério da Magia do Brasil, são um primor que respeita os fãs brasileiro, um de seus maiores públicos, como também mostra o quanto a pesquisa é importante em todos os setores.

Quando o assunto é atuação, Jude Law e Mads Mikkelsen esbanjam categoria. Law encarna um Dumbledore de forma tão convicente que nos faz imagina-lo envelhecendo até chegarmos ao diretor da Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts dos tempos de Harry Potter. O olhar é o mesmo, a forma de falar, o jeito safo, dentre outros aspectos do personagens. Mikkelsen redesenha o Grindelwald de Johnny Depp, levando-o de um aparente lunático para um calculista, cruel e dissimulado. Muito embora, como bruxo das trevas, o Grindelwald apresentado até agora não faça nem cócegas em Lord Voldemort.

Contudo, a despeito do que foi dito de Law e Mikkelsen, o oscarizado Eddie Redmayne parece ser o próprio Newt Scamander. Você não o chamaria de Newt se o visse na rua? Eu, com certeza, o faria expontaneamente. O personagem parece ter sifo feito para ele. E se não fosse suas brilhantes atuações em “Garota Dinamarquesa” e “A Teoria de Tudo”, estaríamos diante do melhor papel da carreira de Redmayne. Sim, Scamander é um ponto fora da curva em toda a franquia de “Animais Fantásticos”. Diferente dos filmes, ele não oscila uma vez sequer.

Com um todo, “Animais Fantásticos: Os Segredos de Dumbledore” é uma ótima diversão para os fãs do mundo bruxo criado por JK Rowling. Está longe de ser um filme descartável, mas poderia ter sido bem melhor construído, pois tinha (e tem!) material para isso. Esperar que os próximos episódios dessa saga consigam resolver bem os problemas deixados e mergulhar mais profundamente nos eventos que antecedem a chegada de Harry Potter. Vai que Voldemort faz uma pontinha em alguma das próximas sequências, não é?

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